Nos últimos muitos crentes têm assumido o conceito “igreja é onde estou, eu sou igreja”. Deste modo, dispensam ir e reunir-se com a congregação. Parece aumentar a ênfase no SER Igreja em vez de simplesmente IR à um local chamado igreja, num esforço nobre de recuperar a essência da fé e discipulado cristão, diminui consequentemente a motivação de se IR também. Para mim esse é um caso clássico do que acontece com todo movimento reacionário: vai de um extremo ao outro. A razão simples porque creio assim é que SER Igreja é algo impossível de acontecer na individualidade. Igreja é sempre plural, comunitário, sempre algo que eu não posso ser sozinho. Mas os conceitos racionais sobrepõem - se cada vez mais às Santas Escrituras e por ordem das coisas ao discernimento espiritual. Isto acontece cada vez mais desde que a Internet disponibiliza cultos, música espiritual, o meu povo pensa “aqui não há mexerico e estou na boa”, quando assim acontece algo está mal. Faz-me pensar naqueles crentes que deixam as suas congregações por incompatibilidade com um outro crente, em vez de resolver com o irmão o problema foge do irmão e vai para outra congregação, aí volta a ter problemas e vai para outra. Parecem borboletas que saltitam de flor em flor. É isto ser cristão, é isto ir à igreja? Não.
Tal coisa só faz sentido numa sociedade cada vez mais individualizada como a nossa (temos feito a lição de casa direitinho com os norte-americanos). Digo isto para quem está tentando seguir Cristo em regiões do mundo como o Norte da África, Médio Oriente e Ásia Central. Nestes lugares encontramos pessoas que anseiam IR e reunir-se com outros e compartilhar a sua fé, as suas lutas, orar juntos, aprender uns com os outros, etc. Mas não é só nos “países fechados” que encontramos esse entusiasmo pela igreja na sua forma congregacional. Na Europa pós-cristã, acontece o mesmo com os seguidores de Cristo que buscam viver a realidade da sua fé neste continente frio. Pessoas viajam 1-2 horas de autocarro ou em carro pessoal para se reunirem como a igreja em países como Alemanha, Suíça, França, etc.
Quando penso sobre isto lembro-me de um professor de teologia, ele era brasileiro, mas tinha vivido um ministério de ensino em vários países do mundo, dizia ele: “A teologia foi elaborada na Europa, está a ser deturpada nos Estados Unidos e testada no Brasil.” Cada dia que passa, mais cresce em mim a sensação de que ele estava certo. Pois esta nova descoberta de SER sem IR é um fenómeno não somente totalmente inédito na história da Igreja, mas arrisco a dizer, algo puramente norte-americano. Somente numa sociedade que pratica o culto individual, lamentavelmente ou está doente fisicamente, então é compreensível e deveria ser preocupação da congregação na medida do possível ter alguns crentes disponíveis para celebrar com ele ou sofre de doença espiritual (orgulho). E o pior, fá-lo como se fosse verdade, uma grande revelação! E só quem não conhece bem as Escrituras nem a História pode embarcar nessa. Pois tanto as Escrituras como a História são claras quando ao assunto; seguir Jesus: Não é algo que se faz sozinho. Seguir Jesus envolve um compromisso com a mutualidade: disposição a repartir a vida com outros para aprender a amar, perdoar, dar e receber, morrer para o eu, servir, etc.
Creio que Henri Nouwen expressou bem o que é SER Igreja:
“A Igreja é o povo de Deus. A palavra latina para “igreja”, ecclesia, origina-se do grego ek, que significa “fora”, e kaleo, “chamar”. A Igreja é o povo de Deus chamado a sair da escravidão para a liberdade, do pecado para a salvação, do desespero para a esperança, da escuridão para a luz, de uma existência centrada na morte para uma existência centrada na vida.
Quando pensamos na Igreja, devemos pensar num corpo de pessoas viajando juntas. Temos que imaginar as mulheres e os homens e as crianças de todas as idades, raças e sociedades apoiando-se um ao outro nas suas longas e, muitas vezes, cansativas jornadas para a morada celestial.”
Note que Igreja é povo de Deus, não indivíduo de Deus. Igreja são pessoas, nunca uma pessoa só.
Muitos argumentam que não estão questionando a validade da comunhão, que praticam comunhão em casas onde compartilham sua fé enquanto comem e bebem alguma coisa. Essa é sua igreja. Eu não questiono sob hipótese alguma esse tipo de experiência. Com certeza posso cultuar com pessoas em reuniões nos lares. A maioria das igrejas em países fechados acontecem assim. Talvez mesmo vivendo num país onde há liberdade de culto, eu deva praticar o pequeno grupo. Mas, pessoalmente, eu sinto falta de certas coisas que uma reunião nos lares simplesmente torna impraticável.
Grupos pequenos geralmente se reunem por afinidade e/ou geografia. Por isso, raramente transpõem barreiras sociais. Dificilmente pessoas alheias ao grupo terão acesso às suas reuniões (qual foi a última vez que você teve um mendigo em seu grupo pequeno?). Nas reuniões congregacionais maiores encontro a oportunidade de me relacionar – ainda que superficialmente – com uma variedade maior de pessoas – as mulheres e os homens e as crianças de todas as idades, raças e sociedades, do texto de Nouwen. Tal encontro abre possibilidades incríveis de ministração do Espírito em minha vida.
Eu também gosto da vibração musical quando a banda toca e me convida a cantar junto canções que expressam meu amor e sentimentos por Jesus e Sua Causa. Difícil encontrar uma banda de rock tocando em grupos pequenos. E por mais que eu goste da informalidade do diálogo e das conversações sobre a fé, da troca de experiências e questionamentos que acontecem nos encontros informais, sinto que preciso também ouvir um bom sermão que me exorte, edifique e console. De um modo geral, sermões (ou pregações) não se encaixam bem em reuniões caseiras – o próprio ambiente pede algo mais conversacional. Além disso, eu reconheço a grande quantidade de dons e talentos distribuídos por Cristo à Sua Igreja e encontro muito mais oportunidades de ver esses dons sendo exercitados em reuniões congregacionais maiores do que nos pequenos grupos.
Bom, estes são alguns motivos que me levam a perseverar na igreja e crer como Rich Mullins que mesmo uma hora numa igreja ruim é melhor que não ir a nenhuma igreja.
Finalmente, eu acredito que SER Igreja é infinitamente mais importante do que simplesmente IR a uma igreja. Todavia, me pergunto seria possível, a longo prazo, SER sem nunca IR?
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